Por que votar em mulheres

Em 21 de março de 2018 por Lara Haje

A loja virtual de ativismo Conspiração Libertina –  que já arrasou no Carnaval com tatuagens temporárias feministas com dizeres como “Não é não” – lançou uma nova linha de produtos com o tema “Vote em mulheres”. Tem adesivo, camiseta e tatoo que dura alguns dias.

Há muitos anos eu já tento votar em mulheres, sempre que encontro uma afinada com minha posição política. E já encomendei um monte de adesivos, porque agora – a pouco mais de seis meses da eleição de 2018 – é a hora de se engajar com força nesta campanha.

E por que votar em mulheres? Vou começar contando um pouco da minha experiência acompanhando a votação da PEC 181/15 na Câmara dos Deputados – aquela proposta que fixa na Constituição a inviolabilidade da vida desde a concepção e que, por isso, na visão de muita gente, poderia dificultar o aborto mesmo em casos hoje considerados legais, como no caso de estupro.

Eu assisti às poucas deputadas que integram a comissão que analisa esta PEC –  mulheres de diferentes partidos, seja de direita ou de esquerda – lutarem contra ela. Porque é inevitável uma mulher pensar imediatamente: e se fosse comigo? E se eu fosse estuprada e, além de ter de lidar com todos os impactos da violência, ainda tivesse dificuldade para abortar se quisesse? (Dificuldade, diga-se de passagem, que muitas vezes já existe hoje, mesmo o aborto sendo legal nesta hipótese).

Claro que um homem pode, por empatia, se colocar no lugar das mulheres e se posicionar contra propostas que retirem direitos delas, como fizeram alguns deputados neste caso. Mas tem algo que é quase inescapável: a tendência de os detentores de mandados eletivos – de as pessoas em geral, na verdade – darem prioridade para os assuntos que os tocam diretamente. Mulheres precisam de mulheres para defender e pautar questões que lhes dizem respeito.

Não é à toa que é a bancada feminina na Câmara quem luta pela inclusão na pauta do Plenário de outra Proposta de Emenda à Constituição, a que reserva uma cota de vagas para as mulheres (PEC 134/15). A cota é tímida – reserva apenas 10% das vagas para mulheres na primeira eleição depois da aprovação da PEC; 12% na segunda; e 16% na terceira. A Câmara dos Deputados já tem 10% de mulheres hoje, mas a ideia é não apenas garantir que não haja retrocessos – só avanços –, como garantir também esse número de mínimo de mulheres nas assembleias legislativas e câmaras municipais.

E os retrocessos devem, sim, ser temidos. Só para dar um exemplo: o número de prefeitas eleitas no Brasil nas eleições de 2016 foi menor do que o número de eleitas em 2012. O número de vereadoras eleitas também foi menor em pelo menos 13 capitais, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral. Tem capital no Brasil, Cuiabá (MT), em que nenhuma mulher se elegeu!

Para além da defesa de direitos para mulheres, a representatividade feminina por si só é importante. Eu morro de vergonha de viver em um país com um ministério formado apenas de homens brancos, sendo que  mais de 52% da população é feminina e negra/parda. Morro de vergonha de viver em um país com a pior representação feminina no Parlamento entre todos os países da América Latina, num país com menos mulheres no Congresso do que o Afeganistão e outros países árabes. O que isso diz sobre nossa sociedade?

O Brasil ocupa a 115ª posição no ranking mundial de presença feminina no Parlamento, dentre 138 países analisados pelo Projeto Mulheres Inspiradoras.

É claro que entre votar em uma mulher desalinhada da minha posição política e um homem alinhado ideologicamente comigo, fico com este. Mas aí entra uma questão importante: muitas vezes para votar em mulheres é preciso deliberadamente procurar conhecê-las. Isso porque em geral os partidos – embora sigam a regra de reservar 30% das candidaturas nas eleições proporcionais para mulheres – não reservam espaço para elas nos programas eleitorais e não destinam dinheiro para suas candidaturas. Procure bem que você vai encontrar uma mulher que te represente, ao menos para os cargos legislativos.

Sabe, diante de uma realidade como esta, não é à toa que a conquista de um mandado eletivo por uma mulher negra da periferia é celebrado. Para os fãs da meritocracia, haja mérito para uma mulher como Marielle Franco. E a execução desta mulher, por conta de suas posições políticas, é um fato estarrecedor, que por si só põe em xeque a classificação do país como democrático. Uma das respostas da sociedade tem de ser, definitivamente, eleger muito mais mulheres como ela.

Bora?

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