Até a semana passada, eu apresentaria Nicolas Behr como os repórteres de Caderno 2 costumam falar dele: o mais importante poeta de Brasília, vanguarda na poesia auto-publicada e marginal, certamente a maior referência em descrever poeticamente essa cidade rica de ambiguidades que ele jamais contornou.
Quando me convidaram para conhecer o viveiro de plantas tocado por ele há vinte anos, completei a imagem: o poeta dos longos cabelos brancos e olhar desafiador vive então perdido no meio do mato, completando o fim-de-mês vendendo uma mudinha aqui outra ali pros maloqueiros que venham lhe ouvir dois ou três versos.
Pois nada como um papo comprido numa manhã de sábado para desconstruir preconceitos.
Nicolas nos recebeu num escritório organizadinho onde, ao lado do original do livro de poesias sensuais que se prepara para lançar, estão contas, faturas, notas fiscais – a coleção completa da burocracia que pauta a vida de qualquer comerciante.
Entre um versinho declamado, uma foto com Renato Russo no meio da galera e uma história deliciosa sobre como era ser jovem no fim dos anos 70 em Brasília, ele atende um cliente, tira dúvida da funcionária, recebe um amigo com um abraço.
“O viveiro é para viver e a literatura para não endoidar. De um lado, a troca concreta do comércio – do outro, a troca mais simbólica que existe na poesia”, descreveu, quase sem se dar conta de que poetiza enquanto conversa.
Mostrando as fotos dos três filhos – os dois mais novos, gêmeos – criados em escola particular graças à lida no comércio de plantas, fala das doidices da época de garoto e do casamento que dura décadas. “Acho boa a surpresa das pessoas quando vêm aqui, porque desmistifica essa imagem do poeta irresponsável, marginal”, disse ele, me pegando em flagra.
Mesmo desconsiderando a delícia da conversa, o viveiro é um evento à parte – com suas flores, plantas pendentes, trepadeiras, palmeiras e frutíferas raras.
Pensar que eu precisei viver 36 anos e conhecer um poeta jardineiro para esbarrar nas primeiras flores de jabuticaba da minha vida, todas branquinhas e grudadinhas no tronco.
Bora?
Viveiro Pau-Brasília
Pólo Verde – Saída Norte
Entre a Ponte do Bragueto e o Balão do Torto
3468-3191
Segunda a sábado, 8h às 18h, domingos e feriados, 9h às 13h.
De brinde, duas sementinhas de Nicolas Behr. Regue direitinho e espalhe por aí.
nem tudo
que é torto
é errado
veja as pernas
do garrincha
e as árvores
do cerrado
naquela noite
suzana estava
mais W3
do que nunca
toda eixosa
cheia de L2
suzana, vai ser
superquadra
assim lá na
minha cama