No meio da crise de caráter e de conteúdo da imprensa, uma coisa me impressiona há vários anos: o desaparecimento do ser humano das notícias. Pouco a pouco no início, e rapidamente nos últimos tempos, a narrativa dos acontecimentos abandonou a pessoa comum. Aquela que não é “autoridade”, não é “especialista”, nem “jornalista”.
A pessoa comum, no jornalismo, é a extraordinária na vida real. É aquela afetada pelos acontecimentos, vive na pele o que está sendo escrito. É, portanto, a parte mais fundamental de toda a história. A opinião que realmente importa.
Com raríssimas exceções, há muito tempo o jornalismo não escuta nem enxerga mais o humano. A boa notícia é que, também há tempos, a imprensa perdeu o monopólio da narrativa. E a ocupação desse espaço vem em múltiplos formatos: livro impresso, filme, blog, plataforma de pesquisa, e outros tantos que ainda nem conheço.
Esse tipo de resistência também existe em Brasília, sabia? Conhece o projeto Lupa? Se não, dedique um tempinho do seu dia pra conhecer pessoas, se colocar no lugar delas. Dedicamos cada vez menos tempo a ouvir com atenção o outro, e não tem nada mais transformador do que isso.
O projeto Lupa reúne depoimentos e fotos de gente que, de alguma forma, conta histórias. Você encontra lá uma mistura de humanos que são tão diferentes quanto semelhantes. O livreiro que faliu, a mulher que curou suas dores escrevendo, o artista que espalha desenhos pela cidade.
Quem conta a história dos contadores de histórias são três mulheres. Naiara Leão, jornalista que largou a imprensa decidida a trabalhar com algo que lhe dê satisfação. Thaís Antonio, que trocou o desenho industrial pelo jornalismo e descobriu que se emociona em contar histórias sobre pessoas. E Emília Silberstein, formada em cinema e fotógrafa por profissão: é quem retrata com doçura as personagens.
Juntas, elas já contaram 63 histórias – e tive a sorte de ser a 63ª. Por algumas horas, saí do meu confortável e quentinho lugar de jornalista, acostumada a olhar e definir o outro, e me deixei ser olhada e definida. Foi um desconforto importante. Obrigada, meninas, por me fazer colocar essa lupa no espelho.
[foto: Pierre Boucher, Jeanine Prévert with Magnifying Glass, 1938]
Bora?
Projeto Lupa
Acesse o site: projetolupa.com
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Eduardo Maciel
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Dani Cronemberger
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