Os homens de ferro de Antony Gormley são intrigantes. No Rio e em São Paulo, por onde passou a exposição “Corpos presentes — Still Being”, 31 esculturas feitas pelo artista britânico a partir do molde do próprio corpo foram espalhadas pela cidade, no topo de prédios, à beira do abismo. Em Brasília, o CCBB abre a mostra hoje com um detalhe mais desconcertante: um ato de vandalismo, no último domingo, obrigou a retirada de uma das esculturas, próxima ao Espaço Israel Pinheiro, atrás da Esplanada. O corpo voltou hoje ao local, com uma base de concreto de reforço (leia nota abaixo).
A assessoria de imprensa do CCBB informou que a escultura foi derrubada – cada uma pesa 630 quilos, imagine o que foi preciso fazer pra jogar o homem de Gormley no chão. Não é a primeira interferência na mostra, mas não há registro de uma reação tão violenta. No Rio, uma escultura ganhou uma caixinha de esmolas com a frase “ajude a arte”, outra recebeu uma camisinha usada, e o artista achou “um luxo, um batismo seminal, de amor”, segundo matéria do O Globo.
Em Brasília, não se sabe o que o britânico achou do vandalismo, assim definido pelo CCBB. Um ato “de amor” certamente não foi, e isso me deixa um pouco envergonhada pela cidade. Por outro lado, diante de uma obra tão provocativa e perturbadora, a agressão ao homem de ferro parece abrir novas perguntas e reflexões. Exatamente o que Gormley quer: perguntas e reflexões. Não só sobre a obra, mas sobre a nossa relação com ela, sobre nós e a cidade. “Por quê?” é uma das questões preferidas do artista, um dos mais celebrados da Inglaterra.
“Corpos presentes” é a primeira grande exposição individual de Gormley no Brasil. No Rio e em São Paulo, a mostra ocupou o espaço do CCBB e se expandiu pela cidade, provocando as mais diversas reações. A mais comum foi o susto – muita gente ligou pra polícia achando se tratar de suicidas.
Em Brasília, a intervenção urbana vai ser bem menos provocativa: são apenas quatro esculturas fora do centro cultural, e nenhuma vai ver a cidade de cima. Uma está no acesso à ponte JK, perto do CCBB, duas foram instaladas na rodoviária (nas plataformas superior e inferior) e a última é a vítima de agressão.
Essa informação foi um pouco frustrante, preciso admitir. Vi a exposição no Rio e a parte mais bacana foi ver aqueles homens distribuídos no centro da cidade, perto do céu. Não achei nada suicida, me senti vigiada por guardiães misteriosos. Sabe Asas do Desejo, do Wim Wenders? Lindo.
Não via a hora de sair de casa, aqui, olhando pra cima, em busca deles. Nessa arquitetura modernista, diferente de tudo o que Gormley viu por aí, os corpos de ferro ficariam lindos demais lá em cima. Mas ok, fica pra outra. A exposição no CCBB, que tem outras esculturas do artista, vale muito a visita.
Bora?
“Corpos presentes — Still Being”
Exposição de Antony Gormley no CCBB
23/10 a 6/01
Terça a domingo, das 9h às 21h
Entrada gratuita
* Nota: Segundo a assessoria de imprensa do CCBB, no domingo a escultura foi encontrada embalada em plástico, no chão. A organização da mostra teve de construir uma base de concreto para firmar a escultura, que foi reinstalada nesta terça.
Esse texto foi atualizado às 16h10.
-
Clarissa Teixeira
-
tiagobotelho
-
Lisaura Cronemberger
-
-
fabiana
-
Franco Bernanrdes