Lei do Silêncio e a turma do 8 ou 80

Em 16 de junho de 2015 por Dani Cronemberger

correio

Capas de jornais costumam me causar emoções negativas, mas a do Correio Braziliense de hoje foi especialmente difícil de engolir. A manchete grita em alto e bom som: UMA LEI DO BARULHO! E o título vem acompanhado de uma ilustração, enooorme, de um morador de pijama, com os dedos tampando os ouvidos, sofrendo bastante com a música ao vivo vinda de um bar. O assunto: hoje, às 9 horas, a Câmara Legislativa promove audiência pública para discutir mudanças na Lei do Silêncio.

A manchete, com tomada de posição nada sutil, não combina com a matéria publicada nas páginas internas, que escuta os dois lados da história e tenta, ainda que prejudicada pela capa, equilibrar a discussão. Como sabemos que a grande maioria dos leitores passa o olho nas manchetes e não chega a ler a matéria inteira, é fácil imaginar qual será a mensagem fixada na cabeça de quem folhear o jornal hoje.

Ainda que a capa de um impresso não seja o lugar adequado para gritar opinião – editoral existe para isso –, há um lado positivo de vermos posições expostas desta forma, sem cerimônia. A discussão fica mais clara.

Aqui no blog, espaço 100% opinativo, faz tempo que deixamos clara a nossa posição a favor de uma atualização na Lei do Silêncio. Publicamos alguns posts explicando nosso ponto de vista e abriu-se, nos comentários, um debate excelente, com opiniões consistentes de ambos os lados. Mas também viramos alvo do grupo 8 ou 80 da internet – aquelas pessoas que não querem ouvir, debater ou ponderar, querem apenas julgar sua opinião.

É para esse grupo que a capa do Correio joga hoje, prestando um desserviço à discussão. Como se atualizar a lei significasse liberar geral o barulho. Como se, ao dizer que o limite atual de decibéis é irreal, você estivesse defendendo o desrespeito ao repouso alheio, a perturbação do sono das famílias, a transformação da vida dos moradores em um inferno.

A atualização da lei não vai permitir o desassossego generalizado, não vai aumentar o barulho nos bares que já incomodam. Certamente, o bar que te inferniza hoje com volume acima do limite, vai continuar fora do limite da nova lei, se ela um dia for aprovada. O que se quer é: tirar a Lei do Silêncio de um mundo fictício, de fadas e duendes, onde o barulho de um terreno baldio no meio do nada já ultrapassa seus limites. (Por favor, assistam a esse vídeo, ele explica tudo melhor do que eu).

O que ser quer, também: definir padrões claros para os locais de medição do barulho. A falta de clareza da lei permite injustiças graves. Um bar que desagrada o governo da ocasião pode ser facilmente fechado, sem que se comprove que o volume do som estava de fato incomodando alguém, enquanto outros bares mais barulhentos permanecem intocáveis.

O que se quer é uma cidade que não ensurdeça seus moradores, nem mate a música de asfixia. Nem 8, nem 80.

Leia mais em:
Porque é preciso mudar a Lei do Silêncio
Movimento “Quem Desligou o Som?”

  • Pingback: Gabarito da folia | quadrado()

  • Dani Santana

    A atual lei do silêncio JÁ é o meio termo. Quer fazer barulho na área residencial, faça até 22h, depois feche. Simples assim. OU invista em isolamento, OU vá se instalar no SIG, SCS, SCN, SDS… não é como se a cidade não tivesse nenhum lugar pra fazer bar ou show. Querem fazer nas Asas pra quê? Brasília não é o Plano Piloto e garanto que quem gosta de álcool vai atrás dele onde ele estiver.

    Se a questão é dinheiro como colocaram aqui, a grande maioria dos jovens do Plano Piloto ou mora na casa dos pais ou ganhou/herdou esses apês. Agora experimenta juntar 1 milhão do seu suor pra virem abrir um bar na sua comercial. Tenta dormir ou fazer uma criança dormir com 65 dB (como estão propondo) dentro de casa a noite toda. Depois vem falar em “8 ou 80”.

    Outra coisa, aonde que showzinho de bar é cultura? Geralmente são intepretações sofríveis das mesmas músicas de sempre.

  • Tiago

    Pois eu também sou morador da Asa Norte, também paguei caro pelo meu apartamento, mas não acho que isso deva ser levando em consideração na análise da mudança: se fosse assim qualquer pessoa com mais dinheiro decidiria como devem ser as leis (bem, já é assim, mas enfim, não dá para usar esse argumento num fórum público de discussão). Aliás, me lembra quando um morador de Ipanema disse em carta ao Globo que não queria metrô lá, pois pagava um dos IPTUs mais caros do país e por isso tinha direito de decidir o que queria ou não por ali.
    Como morador da Asa Norte, quero uma cidade viva e alegre. Viver numa cidade envolve certa dose de barulho. Quando morei no Rio, não havia bares barulhentos por perto, mas havia ônibus que passavam em frente à noite inteira. “Bem, paciência, as pessoas andam de ônibus”, pensei. Muita gente quer morar na meio da mata virgem mas ter uma cidade ao redor. Não dá. Os limites atuais são irreais, qualquer interior de repartição pública os ultrapassa.
    Por isso, concordo com vocês meninas: quem já desrespeita a lei, continuará desrespeitando. E sim, a fiscalização é muito seletiva, todos sabemos disso. Se ela fosse mais efetiva com os barulhentos de sempre, já ajudaria. Eventos no Estádio e ao redor do Ginásio costumam incomodar bastante os moradores do começo da Asa Norte, mas pouca gente fala disso. É como se pelo simples fato de acontecer fora da área residencial não incomodasse, enquanto qualquer empreendimento nas comerciais necessariamente incomodaria.
    Precisamos achar um meio termo, como vocês disseram. Nem 8 nem 80. Ninguém está defendendo o liberou geral. Beijos

    • Dois pontos: há seletividade na fiscalização e quem descumpre a lei continuará descumprindo.

      Pelo amor dos deuses né… A cidade anda regredindo tanto, mas tanto, mas tanto no conservadorismo que olha… daqui há pouco será ilegal até cantar no chuveiro.

      Sinceramente? Se dependesse de mim, eu enviaria pares de protetores auriculares a todos esses que querem morar no meio do nada silencioso sem sair da cidade (e começaria pelo meu prédio na asa sul… por aqui os moradores reclamam até do barulho de um jogo de poker no sábado a noite!!! o.O). Ué, eu tenho que usar tais protetores se quiser dormir ou estudar – por causa de crianças barulhentas, e não por causa de bares. Paciência né… crianças fazem barulho, gente conversando faz barulho, moro na área central da cidade (e minha reclamações começariam pelos preços abusivos irreais dos imóveis, não pela vida em movimento). Pelo amor dos deuses né… os lugares 1 da manhã estão fechados durante a semana (2 da manhã no findi)… pessoal fala como se ficasse tudo aberto até amanhecer (como era na minha época de adolescente).

  • Correio Braziliense = Lixo. Qualquer pessoa menos desinformada sabe que a imprensa brasileira está na mão de três ou quatro famílias (todas do mesmo lado, que mamam nas mesmas tetas e tem os mesmos interesses) e que a qualidade da informação é horripilante. Mas pelo menos no Globo, na Folha e no Estadão, dá para aproveitar o caderno de cultura, de esporte e as palavras cruzadas. No Correio, nem isso.

  • Desculpa, Dani, mas sua leitura de imagem está equivocada. A charge não tende a nenhum lado. Cuidado para não agredir a quem não tem nada a ver com sua “luta”. Olha mais uma vez! 😉

    • Juliana, não precisa se desculpar por dar sua opinião. A minha crítica não foi à charge especificamente, foi à forma como o jornal montou a capa, com um trocadilho questionável na manchete, que pode realmente levar à desinformação. Acho que, ontem, realmente pesei a mão na análise, hoje já teria escrito de uma forma diferente. Mas esse tipo de capa, subjetiva, leva a leituras igualmente subjetivas, cada pessoa lê de uma forma. Existe um limite tênue ali entre informação e opinião. Não fique chateada, não houve crítica pessoal a ninguém, muito menos “agressão” (não entendi por que esse verbo foi incluído no seu comentário). Abraço!

  • O problema não é só a capa. Tem um “erro”: a reportagem disse que o PL que altera a lei propõe limite de 75 dB DENTRO DA CASA DO RECLAMANTE, quando, na verdade, o limite proposto é 55 dB. Claro que 75 dB dentro de casa não é razoável, né gente? Por quê não erraram meu nome? Botassem Gabriela Nunes, Antunes, Punes, Xunes, Bunes, qualquer coisa eles poderiam ter “errado”, menos isso que realmente erraram. Confesso que fiquei xatiada, porque eu, que estou nessa batalhar por uma cidade melhor, tenho tantas vezes dito que a coisa mais importante é a abertura ao diálogo, é exercer a arte da escuta. Defendo tanto o não-silenciamento para eu mesma não escutar os outros? Seria muita incoerência. Então, tenho repetido incessantemente que é preciso sim uma lei que proteja as pessoas do incômodo dos barulhos indesejados, mas é preciso uma lei que PROTEJA O INCOMODADO SEM AMORDAÇAR O EMISSOR, para que a lei não vire uma lei de silenciamento em vez de uma lei do silêncio. E eu queria agradecer ao quadrado brasilia pela forma respeitosa que sempre falam dessa questão que para nós é tão importante. Seus lindos, nossa cidade é linda e fico feliz de estar junto de gente como vocês. Obrigada.

  • A capa diz exatamente o contrário. Há quem tolere e há quem não tolere o som emitido pelos músicos da noite. A capa mostra isso.

  • Thiago

    Eu ainda acho que as pessoas deviam ter mais conscienciq do preco que pagam de aluguel ou compra de apartamento. O cara paga mais baratomorq morar na comercial, ou virado pra comercial. E quer o silencio de quem mora no predio que fica virado pro gramadi, la no meio da quadra. O silencio tem seu preco, assim como em qualquer cidade grande.

    • As pessoas pagam os preços que pagam, com a chancela de uma lei que existe para protegê-las. O que você está querendo sugerir com teu comentário é uma inversão de valores. Botando a culpa em quem compra imóvel barato. Discordo completamente.

      • Eduardo S. lobão

        Apoiado Luciano. Sou morador da asa norte paguei caro no meu apto e quero viver com tranquilidade. Se você quer ter seu comércio com música que faça o seu isolamento acústico, em mande quantos decibéis quiser dentro dele, mas fora dele NAO! E respeite o seu próximo. Esse PL 445/15 é de um monte de gente que defende interesses econômicos, bares , e colocam os músicos contra a população! Aumentar os decibel sem critério e estudo técnico e dar um tiro no escuro, barulho é caso de saúde pública. A matéria do Correio hoje, depois de muita parcialidade a favor da alteração da Lei do Silencio foi justa com os moradores. Vamos defender nossos direitos, respeitando nosso próximo, coisa que muitos que estão por trás desse PL não estão fazendo, defendem sim seus interesses e querem que a população seja banida.
        NÃO AO PL 445/2015!

  • Falando apenas da charge, eu achei que ela foi até generosa com a turma que apoia o barulho. Você deve ter notado, apesar de não ter citado, mas tem um cara ali dormindo com um baita sorriso no rosto, e no bar, só um músico, tocando violão e pessoas sentadas civilizadamente em suas mesas. Podia ser bem pior, e mais realista, não é verdade?
    Quanto à alteração da lei, sou da opinião de que quem já não obedece esta, não vai obedecer a nova, seja ela qual for. E não sou a favor de facilitar a vida de quem não cumpre a lei.

    • Também sou a favor da revisão da Lei do Silêncio mas não achei a capa absolutamente nada tendenciosa, como o texto sugere…

    • Alessandra Oliveira

      Endosso!

  • Preguiça demais dessa cidade intolerante.