Envelhecimento é algo que, quase sempre, tem muito mais a ver com a cabeça do que com o corpo. A idade real da pele e dos músculos não tem a menor importância aqui: velha, no caso, é minha idade mental. Saio do Cão Véio, o novo bar/hamburgueria da moda, com a certeza de que minha paciência tem 90 anos e minha chatice já começou a andar curvada, de pantufa e casaquinho nos ombros.
Antes de tudo, este não é um texto bairrista, contra a invasão maligna de uma franquia paulistana. Lugar bom é lugar bom, de Brasília ou de fora, e quanto mais, melhor. Não me importa também que o chef seja celebridade de reality show (Henrique Fogaça, do MasterChef, é sócio do Fernando Badauí, vocalista da banda CPM22, e Marcos Kichimoto, roadie de bandas como Sepultura e Ratos de Porão, no bar de São Paulo que tem sua primeira franquia em Brasília).
Minha única resistência ao Cão Véio era ligada à moda, esse conceito abstrato que faz pessoas se estapearem por uma fila de espera de mais de 20 mesas. Coisa a que me submeteria só se estivesse à beira da desnutrição e não houvesse qualquer outra comida num raio de 300 quilômetros.
Mas bem, na tentativa de ser uma pessoa jovial, combinei com uma amiga de ir pra lá às 18h em ponto. Fome eu não tinha nenhuma (quem tem fome de hambúrguer às 18h?), mas completei a missão: fui a primeira a entrar e agarrei uma mesa.
Folheando o cardápio, li um monte de coisas boas e quis experimentar quase tudo – bom sinal. Além dos sanduíches, muitos petiscos, várias cervejas artesanais, e pratos com carne e acompanhamentos. Comecei com um bolinho de arroz e, hummm, muito bom.
Eu bebia a cerveja feliz, mas ao contrário do que costuma acontecer, quanto maior meu teor alcóolico, mais barulhento ficava o lugar. O Cão Véio exala a virilidade macho-roqueira-paulista dos donos: escuro e cheio de madeira, parece um pub com um rock’n’roll sempre nas alturas.
Tentei abstrair o Sepultura berrando na minha cabeça enquanto comia um hambúrguer de porco e sofria pra ouvir o que minha amiga falava a 50 centímetros de mim. Foi um pouco demais. Duas horas lá dentro me renderam uma dor de cabeça e o retorno rápido à velhice em seu estado bruto.
Comecei a olhar em volta e a fazer notas mentais de reclamações. O bolinho tava delícia, mas o hambúrguer, já comi melhores. A prateleira com o livro do Fogaça, posando de bad boy na capa, os anúncios de camisetas e moletons com a logo do bar (Hard Rock Café feelings), tudo parecia estar à venda, inclusive o próprio lugar – o cardápio faz propaganda pra quem quiser abrir franquia. Do que uma dor de cabeça não é capaz.
Mas como disse: estou velha. O lugar fica lotado de pessoas menos chatas que parecem se divertir muito. Ou seja, não dê a mínima pra mim.
Bora?
Cão Véio
404 Sul, Bloco C
(61) 3257-8455
Foto: origem desconhecida
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Kelly Resende Borges